Adolescente paquistanesa muçulmana de 17 anos e
sexagenário hindu indiano distinguidos pela sua luta em defesa dos direitos das
crianças
A Academia sueca conseguiu com a atribuição partilhada do Nobel à
paquistanesa Malala Yousafzai e ao indiano Kailash Satyarthi premiar a defesa
dos direitos humanos das crianças e em simultâneo dividir a distinção entre as
duas potências nucleares inimigas asiáticas.
Ao premiar um hindu e uma muçulmana, um indiano e uma paquistanesa, o
comité quis também distinguir uma "luta conjunta pela educação e contra o
extremismo" nesta conturbada parte do mundo.
Este ano houve um registo recorde de 278 nomeações, mais 19 que no ano
anterior, incluindo o homem que denunciou o escândalo das espionagem da NSA
norte-americana, Edward Snowden, o ex-soldado dos EUA que desertou para os
talibãs Chelsea Manning, o presidente russo, Vladimir Putin, e o Papa
Francisco.
Entre os anteriores galardoados contam-se Nelson Mandela, Aung San Suu Kyi,
Martin Luther King, e até o controverso premiado nesta categoria, Barack Obama
em 2009.
A luta contra a opressão das crianças e dos jovens e o direito à educação
foram segundo o comité a razão central da atribuição do Nobel da Paz 2014 a
Malala Yusafzai e a Kailash Satyarthi.
"As crianças devem ir à escola e não devem ser financeiramente
exploradas", lê-se no início do comunicado ontem divulgado em Oslo.
Nos países mais pobres, segundo o comité, 60% da população tem menos de 25
anos, pelo que o respeito pelos direitos das crianças e dos jovens é
"condição de um desenvolvimento global em paz".
O comité considera que "nas zonas de conflito, a violação da
integridade das crianças conduz à perpetuação da violência, de geração em
geração".
No caso do activista indiano, presidente da Marcha Global contra o Trabalho
Infantil, o comité destacou a "grande coragem pessoal" de Satyarthi,
que, "na tradição de Ghandi", liderou protestos, sempre pacíficos,
para denunciar a exploração infantil.
O comité destacou ainda a contribuição do activista para o desenvolvimento
de "importantes convenções internacionais de direitos das crianças".
Kailash Satyarthi, de 60 anos, é natural de Vidisha, no estado indiano de
Madhya Pradesh, e preside a uma organização não-governamental que luta contra a
exploração infantil.
Em 1998 liderou uma mobilização civil contra a exploração infantil que
reuniu cerca de 7,2 milhões de pessoas e posteriormente não só levou à fundação
da ONG Marcha Global, mas manteve o seu líder ligado a outros movimentos e
causas civis.
Abandonou a carreira de engenheiro e, nos últimos 25 anos, já conseguiu
salvar dezenas de milhares de crianças e adultos mantidos em regime de
escravidão, sobretudo em fábricas indianas, onde estavam em condições
miseráveis e com as conhecidas longas jornadas de trabalho das sweatshops
orientais.
O seu trabalho já fora premiado com vários galardões, entre os quais o
prémio espanhol Alfonso Comin, o galardão internacional Frederic Ebert, na
Alemanha, e o Prémio Internacional dos Direitos Humanos Robert F. Kennedy.
O indiano galardoado com o Nobel organiza campanhas de consciencialização
com protestos que seguem os preceitos pacíficos de Mahatma Ghandi.
Por sua vez, Malala Yusafzai foi distinguida porque, "apesar da sua
juventude, luta há vários anos pelo direito das raparigas à educação e mostrou
com o seu exemplo que crianças e jovens também podem contribuir para melhorar a
sua própria situação".
"Ela fê-lo nas circunstâncias mais perigosas. Através da sua luta
heróica, tornou-se uma porta-voz do direito das raparigas à educação", diz
o comité no seu comunicado.
Segundo os números avançados pelo comité norueguês, há no mundo cerca de
168 milhões de crianças que trabalham, menos 78 milhões que em 2000. "O
mundo aproxima-se do objectivo de erradicar o trabalho infantil",
considera o comité.
"O combate à repressão e a favor dos direitos de crianças e jovens
contribui para a realização da 'fraternidade entre as nações' mencionada por
Alfred Nobel no seu testamento como um dos critérios de atribuição do prémio
Nobel da Paz", concluiu.